MENSALÃO: ENTENDA O CASO QUE SERÁ JULGADO PELO STF
Com a decisão da Suprema Corte, que marcou para 1º de agosto o início
do julgamento, relembre o que aconteceu, quem são os réus e do que eles são
acusados.
38 réus, 147 volumes,
173 apensos, 69 mil páginas. Os números do processo do mensalão, que começará a
ser julgado em agosto pelo STF.
Sete anos
depois do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), denunciar a sua existência,
numa entrevista à jornalista Renata Lo Prete, na Folha de S. Paulo, foi marcado
pelo Supremo Tribunal Federal (STF) o início do julgamento do mensalão. Em
reunião na tarde de quarta-feira (6), os ministros da Suprema Corte aceitaram
uma sugestão de cronograma feita pelo ministro Celso de Mello, que marca o
início do julgamento para o dia 1º de agosto. A expectativa é que as sessões do
que deverá ser o mais importante julgamento de cunho político da história da
Suprema Corte estendam-se até setembro.
São 147
volumes e 173 apensos, que formam nada menos que 69 mil páginas de um processo
com 38 réus (dos 40 acusados inicialmente, morreu o ex-deputado José Janene, do
PP, e o ex-secretário do PT Sílvio Pereira fez um acordo com a Justiça pelo
qual cumpriu 750 de trabalho comunitário em troca de colaborar com a
investigação). O relatório que acolheu a denúncia do então procurador-geral da
República, Antônio Fernando de Souza, foi feito pelo ministro Joaquim Barbosa.
Na peça acusatória que será lida no dia 1º de agosto, o atual procurador-geral
da República, Roberto Gurgel, pedirá a condenação de 36 réus. Ele pede a
absolvição do ex-ministro da Secretaria de Comunicação Luiz Gushiken e do
ex-assessor do PF (hoje PR) Jacinto Lamas, por falta de provas contra os dois.
Para que se cumpra o calendário acertado pelos ministros do
Supremo, é necessário que seja concluído o relatório revisor, sob a
responsabilidade do ministro Ricardo Lewandowsi. Ele, porém, já informou que
terminará seu trabalho até o final deste mês. Em seguida, em julho, o poder
Judiciário entra em recesso, e os ministros retornarão, então em agosto, para
se debruçar sobre o caso. Na primeira parte do julgamento, estão previstas
sessões diárias, de segunda a sexta, para acelerar o julgamento. Depois, quando
começarem os votos dos ministros, as sessões serão três vezes por semana. A
expectativa é que o julgamento se encerre em setembro.
Veja como será o calendário de julgamento do mensalão
Para
facilitar a compreensão do que será julgado, o Congresso em Foco faz uma pequena memória do caso, desde seu início
até o acolhimento pelo STF da denúncia do mensalão. Acompanhe:
ACORDO COM O PL
Em meados de
junho de 2002, o então candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva aposta
na composição de uma chapa tendo como seu vice o senador e empresário do ramo
têxtil José Alencar. A presença de Alencar na chapa seria uma forma de diminuir
as reações do empresariado e dos setores mais conservadores da sociedade. Para
tanto, Lula precisaria compor uma aliança com o PL (hoje PR), o partido de
Alencar à época. Como contrapartida para compor a chapa, o presidente do PL,
Valdemar Costa Neto, exige um reforço de caixa para ajudar a financiar a
campanha de seu partido. Acertou-se um formato de financiamento que acabou
estendido a outros partidos aliados, como o PTB e o PP.
O MENSALÃO
No dia 24 de
setembro de 2004, reportagem do Jornal do Brasil denuncia que o
esquema de financiamento teria se transformado num pagamento periódico, uma
espécie de “mesada” a partidos aliados em troca de apoio ao governo. A
reportagem, assinada pelos jornalistas Paulo de Tarso Lyra, Hugo Marques e
Sérgio Pardellas, atribiu a denúncia ao ex-líder do governo na Câmara Miro
Teixeira (PDT-RJ). Segundo a matéria, Miro teria ouvido de parlamentares que
havia “um esquema de distribuição de verbas e cargos para premiar partidos da
bancada governista”. O esquema era chamado de “mensalão”.
No dia seguinte, o então presidente da Câmara, João Paulo
Cunha (PT-SP), disse que iria determinar a apuração das denúncias, mas já
adiantava que seria no sentido de desmentir “notícias infundadas”. Miro, por
sua vez, publicou nota negando que a denúncia tivesse partido dele. Sem a
confirmação de Miro, o caso caiu momentaneamente no esquecimento.
ROBERTO JEFFERSON
Em maio de
2005, reportagem de capa da revista Veja mostra o ex-diretor dos
Correios Maurício Marinho recebendo em seu gabinete uma propina de R$ 3 mil.
Maurício era flagrado num vídeo recebendo o dinheiro. Ele pertencia à cota do
PTB no governo. Por essa razão, o caso rapidamente desviou-se para o presidente
do PTB, Roberto Jefferson, que se sentiu acuado. Uma CPI foi criada para
investigar o caso, e novas denúncias começaram a surgir contra o PTB. Com a
suspeita de que a denúncia tivesse partido do próprio governo, mais
especificamente, segundo sua análise, do então ministro-chefe da Casa Civil,
José Dirceu, Roberto Jefferson resolveu contra-atacar.
No dia 6 de
junho, Jefferson concedeu uma entrevista à jornalista Renata Lo Prete, então naFolha
de S. Paulo, em que denuncia a existência do mensalão. Jefferson repete, com
detalhes, a história que havia sido publicada quase um ano antes pelo Jornal do
Brasil. O mensalão passa a ser parte dos fatos investigados pela CPI dos
Correios, e Roberto Jefferson é convocado para repetir sua denúncia.
O VALERIODUTO
No
depoimento à CPI, Roberto Jefferson detalha o que depois ficou conhecido como
“Valerioduto”. Como mais tarde descreverá o ex-procurador-geral da República
Antônio Fernando de Souza na denúncia do mensalão, os dirigentes do PT teriam
criado um esquema para “comprar suporte político” dos partidos aliados. Para
tanto, foram buscar um publicitário de Minas Gerais, Marcos Valério, que tinha
montado esquema semelhante para o PSDB de Minas Gerais, na campanha do hoje
deputado Eduardo Azeredo ao governo do estado. Marcos Valério daria o suporte
financeiro ao esquema, em troca de contratos no governo.
Em seu
depoimento, Roberto Jefferson afirma ter recebido uma mala com R$ 4 milhões das
mãos do próprio Marcos Valério. E diz que os políticos aliados faziam saques na
boca do caixa em uma agência do Banco Rural que funcionava no 9º andar de um shopping center de Brasília.
BANCO NO SHOPPING
A agência do
Banco Rural funcionava numa torre de escritórios anexa ao shopping e, para a sua entrada, era exigida a exibição de algum
documento de identidade. Assim, havia um registro na portaria do shopping que mostrava quem tinha entrado
e para qual andar se dirigia. Foi possível, assim, verificar-se que vários
políticos ou seus assessores estiveram na agência do Banco Rural. Mais tarde, a
CPI dos Correios pode constatar, nas suas investigações, que eles – ou pessoas
ligadas a eles – efetivamente fizeram saques das contas do valerioduto.
OS MENSALEIROS
A CPI dos
Correios confirma, ao final de seus trabalhos, a existência do mensalão e
recomenda a cassação dos mandatos de 18 deputados: Bispo Rodrigues (PL-RJ),
João Magno (PT-MG), João Paulo Cunha (PT-SP), José Borba (PMDB-PR), José Dirceu
(PT-SP), José Janene (PP-PR), José Mentor (PT-SP), Josias Gomes (PT-BA), Paulo
Rocha (PT-PA), Pedro Correia (PP-PE), Pedro Henry (PP-MT), Professor Luizinho
(PT-SP), Roberto Brant (PFL-MG), Roberto Jefferson (PTB-RJ), Romeu Queiroz
(PTB-MG), Sandro Mabel (PL-GO), Valdemar Costa Neto (PL-SP), Vadão Gomes
(PP-SP) e Wanderval Santos (PL-SP). Para escapar da perda do mandato, renunciam
Valdemar Costa Neto, Paulo Rocha, José Borba e Bispo Rodrigues. O deputado José
Janene afasta-se por problemas de saúde (ele morreu em setembro de 2010). José
Dirceu – apontado como o comandante do esquema –, Roberto Jefferson – o
denunciante, mas que confessou ter recebido dinheiro do esquema –, e Pedro
Corrêa – ex-presidente do PP – foram cassados. Os demais foram absolvidos.
A DENÚNCIA
No dia 11 de
abril de 2006, o então procurador-geral da República, Antônio Fernando de
Souza, apresenta a denúncia do mensalão. Ele acusa 40 pessoas de participarem
de uma “sofisticada organização criminosa” destinada a “garantir a continuidade
do projeto de poder do Partido dos Trabalhadores, mediante a compra de suporte
político de outros partidos”.
AÇÃO PENAL 470
Em agosto de
2007, o Supremo Tribunal Federal aceita a denúncia de Antônio Fernando de
Souza. Passa a tramitar a Ação Penal 470. Os réus são acusados de crimes como
formação de quadrilha, peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão
fraudulenta e evasão de divisas.
(Postado em Congresso em Foco)
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