O fim dos rodeios e das vaquejadas depende de nós
Caro(a)
leitor(a), este artigo possui dois objetivos básicos:
1º) demonstrar que tanto o rodeio como a vaquejada
constituem inaceitáveis crueldades contra os animais, posto que são práticas
viciadas pela inconstitucionalidade, ilegalidade e sadismo. Apesar das
diferenças histórica e sócio-cultural existentes entre o rodeio e a vaquejada,
ambos serão tratados de acordo com os mesmos argumentos - posto que cometem
semelhantes crueldades contra os animais;
2º) propor estratégias de ação a serem realizadas pela
sociedade civil organizada e pelo Estado (Ministério Público, Polícias e pela
Defensoria Pública) com a finalidade de extinguir de nossa sociedade essa
triste exploração econômica da crueldade com os animais. Acreditamos que o fim
dos rodeios e das vaquejadas, no Brasil, depende de nós!
A título de
introdução, cabe dizer que a Constituição Federal de 1988 (CF/88) é a lei
suprema do ordenamento jurídico brasileiro. A Carta Magna constitui o nosso
maior patrimônio cultural, político e jurídico – é o nosso modelo de
convivência social, a matriz das “regras do jogo”, o nosso “contrato social”,
na visão de Rousseau. Em função disso, a Constituição Federal é a norma que
dispõe do poder de subordinar todas as demais normas jurídicas e todos os atos
públicos e privados, no território brasileiro. Estando hierarquicamente em
situação suprema, acima de todas, é indispensável - para que a segurança, a paz
e a ordem prevaleçam entre nós - que todas as demais normas e condutas do poder
público e da sociedade civil estejam em conformidade com o que dispõe a
Constituição Federal. E se não estiverem? Nesse caso, padecem do vício da
inconstitucionalidade e devem ser anuladas, sendo ajustados os efeitos já
produzidos.
Chama a
atenção que apenas e tão somente por duas únicas vezes nossa Constituição
Federal utiliza a palavra crueldade em seu texto. Quando? Quando se refere às
crianças (Art. 227, CF/88) e aos animais (Art. 225, § 1º, VII, CF/88), no
sentido do dever inafastável de ambos serem protegidos por todos, Estado e
sociedade, de sofrerem qualquer prática de crueldade.
Cabe louvar
essa maravilhosa atuação de nosso Poder Constituinte Originário, em 1988, ao
explicitar e positivar no texto de nossa Carta Magna a palavra “crueldade”
nesses dois contextos - como proibição em relação às crianças e aos animais!
Portanto, não resta nenhuma dúvida de que é dever constitucional de todos,
poder público e cidadãos, assim se comportarem em relação às crianças e aos
animais: sem crueldade! Não se trata de favor, mas, sim, de obrigação derivada
do mais elevado status jurídico: a
norma suprema, a Constituição Federal.
Para
estabelecer uma base e conformidade conceitual, cabe esclarecer que por
crueldade deve-se entender qualquer conduta humana consciente e voluntária que
imponha dor (nível físico) ou sofrimento (nível mental) desnecessário ao outro (pessoa
ou animal).
Cabe
examinar, no conceito de crueldade, o termo “desnecessário”: Desnecessário é a
dor ou o sofrimento provocado pela ação humana que é dispensável para a
manutenção e funcionamento sadio, respeitoso, em ordem e equilibrado da vida
social e natural. Exemplo: Se o policial, com moderação, no estrito cumprimento
do dever legal e em legítima defesa de terceiros, domina e prende o assaltante
de uma idosa, estará causando dor e sofrimento a esse meliante, mas não se
trata de crueldade, pois a ação foi necessária, equilibrada e benéfica para a
ordem social. Ao contrário, cruel é toda ação humana que impõe dor ou
sofrimento a alguém (pessoa ou animal), nada acrescentando de benefício à ordem
social, à beleza da vida e à consciência ética e moral das pessoas.
A crueldade,
portanto, diminui o esplendor e a beleza da vida! A crueldade só encontra eco
na alma distorcida, doentia e pervertida de pessoas afeitas à covardia e ao
sadismo (psicopatologia de gozar com a dor alheia). Afirmar isso não configura
um julgamento de valor, mas, sim, mera constatação objetiva.
Para os que
comparam as práticas do rodeio e da vaquejada com um “esporte” (também o fazem
em relação à “caça”, meu Deus!), afirmamos que é um engano e disparate total
essa analogia. Muito antes pelo contrário, esporte significa dois competidores
em situação de igualdade, treinados e voluntariamente querendo participar da
luta pela vitória. Não é o caso dos rodeios ou das vaquejadas, nos quais os
assustados e despreparados animais são violentamente forçados a se submeter a
práticas desiguais e covardes. Para os romanos, colocar os primeiros cristãos
na arena para lutarem com leões e gladiadores armados e treinados também era
considerado um espetáculo e um ”esporte”. Será que não devemos, em respeito à
evolução da sociedade inaugurada pelo cristianismo e em obediência ao texto
supremo da Constituição Federal, superar essa bárbara covardia, esse sádico
espírito dos romanos, que infelizmente ainda perdura entre nós?
Nossos
modelos éticos e espirituais, tais como Jesus Cristo, São Francisco de Assis ou
Gandhi, são totalmente incompatíveis com a covardia e a crueldade para com os
animais. Ao contrário, exemplificam e ensinam o amor à natureza e a tudo que
vive!
Portanto,
que fique claro que o conceito de crueldade é indissociável da idéia de uma
conduta humana desnecessária e contrária à ordem, à moral, à espiritualidade,
aos bons costumes e ao bom funcionamento da vida social e natural.
Por tudo
isso, devemos necessariamente concluir e divulgar que os rodeios e as
vaquejadas, além de serem tipificados como crimes de maus tratos, previsto no
artigo 32, da lei 9.605/98, constituem uma atividade inconstitucional, posto
que impõem crueldade aos animais, desrespeitando frontalmente o artigo 225, §
1º,VII, da CF/88, abaixo citado:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade
desse direito, incumbe ao Poder Público: VII - proteger a fauna e a flora, vedadas,
na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,
provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.”
Com base
nesse texto constitucional, recordamos que é preciso ter esperança na força dos
movimentos sociais, que, muitas vezes nascem pequenos e idealistas, mas que
conseguem, através da organização, da perseverança, do trabalho inteligente e
do amor à causa, crescer e obter grandes e históricas vitórias para a defesa
dos animais. Unidos e perseverantes somos mais: o fim dos rodeios e das
vaquejadas no Brasil depende de nós!
Agora,
propomos ações estratégicas para, em união e com perseverança, extinguirmos o
rodeio e a vaquejada de nosso território nacional:
1ª ação: Boicote o
consumo dos produtos das empresas que patrocinam os rodeios e vaquejadas.
Sabe-se que a força do consumidor é incomensurável no sistema capitalista. Quem
manda é o consumidor - se e somente se conseguir união com parcela
significativa dos demais consumidores - em função de suas reivindicações.
Assim, propomos que devemos boicotar os produtos dessas empresas patrocinadoras,
notadamente as de bebidas alcoólicas, buscando e propondo alternativas de
consumo. Com o tempo e com permanentes campanhas nas redes sociais e em outras
mídias, do tipo “não consuma produtos x ou a cerveja y, pois ela patrocina a
crueldade dos rodeios”, essas empresas, preocupadas com o risco de imagem e com
a perda de rentabilidade pela diminuição do consumo, irão retirar seu patrocínio
desses eventos de rodeios. Sem os patrocínios, esses eventos diminuem de porte
e tendem gradualmente a deixar de existir. Atualmente, há um esforço
internacional para associar a imagem das empresas com ações em benefício da
natureza. Sabe-se que o marketing (nem sempre verdadeiro) da sustentabilidade é bem visto pelo
consumidor e, assim, gera o aumento do consumo dos produtos dessas empresas. Ao
contrário, temos a convicção de que nenhuma empresa vai querer ter sua imagem
sendo vinculada negativamente nas redes sociais por estar patrocinando eventos
que agridem os animais e a natureza. Lance essa campanha nas redes sociais (já
existem vários grupos no Facebook e Orkut contra os rodeios, mas que não atuam
dessa forma), envie emails e corrente de email como se fosse uma petição
pública (para seus contatos e para os SACs dessas empresas), faça adesivos para
os carros, etc.
A mensagem
básica é: “Não consuma produtos xxx, pois essa empresa patrocina a crueldade
com os animais nos rodeios!”
A força
dessa 1ª ação nas redes sociais e em outras mídias é muito poderosa e, sendo
bem executada, com perseverança, atingirá a coluna dorsal dos eventos de
rodeio: o dinheiro dos patrocinadores. É uma questão de perseverança,
divulgação intensa e tempo para a empresa reagir positivamente às campanhas e deixar
de patrocinar os rodeios. Seja um consumidor consciente de seu poder e dos
efeitos de suas escolhas no momento de consumir. Com essa estratégia, podemos
transformar o mundo! Os maiores exemplos de campanhas nesse sentido são os
promovidos pela PETA, organização não governamental, que luta pelos direitos
dos animais em todo o mundo. Um excelente exemplo, no Brasil, dessa campanha de
boicote contra os patrocinadores de rodeios, encontramos no siteWWW.ativismo.com,
especificamente no link patrocinadores de rodeios a serem boicotados. Neste link está
a lista das empresas, com os respectivos endereços para contato, que possuem
histórico de patrocinar rodeios e que, portanto, devem ter seus produtos
boicotados. Mas apenas não comprar não é o suficiente! É indispensável que
você, através dos endereços virtuais e telefones fornecidos pelo site patrocinadores de rodeios a serem boicotados, entre em
contato com a empresa e manifeste sua crítica pelo fato de patrocinarem os
rodeios, afirmando que essa é a razão de seu boicote aos seus produtos e
serviços e dizendo que convidará todas as pessoas de seu círculo social para
que façam o mesmo. Os animais agradecem o seu esforço!
2ª ação: Pressão e
boicote aos artistas que se apresentam nos eventos de rodeio e vaquejada.
Dentro da mesma lógica exposta na 1ª ação, nenhum artista ou grupo musical vai
querer ter seu nome associado com a imagem da crueldade com os animais. Assim,
devemos enviar emails, telefonar e entrar em contato com os artistas,
empresários, fãs-clubes e gravadoras, afirmando que não compraremos nenhum CD,
DVD ou produto, nem iremos a shows enquanto tal artista não parar de se
apresentar em eventos de rodeio, pois eles estão distraindo a multidão da
crueldade ali perpetrada contra os animais. Como exemplo de artistas renomados
que, independente da oferta financeira, se recusam a se apresentar em eventos
de rodeio, podemos citar Rita Lee, Chico
César (que compôs a música “odeio rodeio”, em parceria com Rita Lee), Zélia
Ducan, Danilo Gentilli, dentre outros mais conscientes e sensíveis à causa
dos animais. Recomendamos o vídeo em que Danilo Gentilli denuncia, através do
humor, a crueldade dos rodeios: Danilo
Gentilli contra os rodeios. Conforme antes explicamos, Gentilli falhou
apenas em caracterizar o rodeio como “esporte”, mas, no contexto de sua
dedicação à defesa dos animais e do gênero do humor, está escusado dessa falha
– que, entretanto, não deve ser repetida. Melhor caracterizar o rodeio como uma
prática “americanizada” atrasada, um costume bárbaro, uma atividade econômica
de massa alienada e insensível que explora o sofrimento dos animais, pois,
assim, está de acordo com a realidade dos fatos.
Penso que a
maioria dos artistas nacionais ainda precisa ser sensibilizada, conscientizada
e educada para, não sendo cega pelo poder do dinheiro, usar o coração e se
aliar em favor da defesa dos animais boicotando os rodeios. Sem a participação
dos grandes nomes artísticos nesses eventos, estes serão enfraquecidos. A
verdadeira arte não se alia à exploração econômica do sofrimento dos animais.
3ª ação: Pressão
sobre os vereadores e o prefeito de seu município para que seja aprovada e
sancionada lei municipal que proíba a realização de rodeio no território do
município. Como exemplo, citamos a seguinte lista de cidades que, através de
leis municipais, proibiram a realização de rodeios, vaquejadas ou eventos semelhantes:
São Paulo, Rio de Janeiro, Sorocaba, Guarulhos e Jundiaí. Mobilize a sociedade
civil organizada de sua cidade e cobre a edição dessa lei proibitiva dos
rodeios em seu município. Da mesma forma, é necessário se fazer pressão sobre
os deputados estaduais e sobre o governador para que seja aprovada e sancionada
a lei estadual que proíba a realização de rodeio e vaquejada no território do
Estado. Da mesma forma, em relação aos deputados federais e senadores e ao
presidente do país, em relação à aprovação e sanção de lei federal que proíba a
realização de rodeio e vaquejada no território do Brasil.
4ª ação:
Ajuizamento de ação civil pública ambiental, com pedido de antecipação de
tutela, pedindo o sentenciamento da empresa ré (que irá promover o evento de
rodeio) na obrigação de não o fazer, sob pena de multa diária. Como exemplo
dessa ação estratégica, citamos abaixo trecho do acórdão prolatado nos autos da
Apelação n° 0013772-21.2007.8.26.0152, no TJSP, de março de 2011, que retrata
vitoriosa e exemplar atuação dessa ONG e do Poder Judiciário :
“A MOUNTARAT ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO AMBIENTAL ajuizou Ação
Civil Pública Ambiental contra MARCELO CHADDAD MAGOGA (DOCTOR'S RANCH), a
alegar que o requerido realizaria o II Festival de Laço e Tambor, entre os dias
01 e 02 de dezembro de 2007, na Fazenda de Caucaia, n° 1.000, Município de
Cotia, evento que incluiria laço em dupla (team roping). Sustentou que os
animais utilizados no evento são submetidos a tratamento cruel e expostos à dor
e ao sofrimento, em razão do uso de sedem, de esporas e de corda americana, e
da realização de violentas provas de laço e derrubadas. Afirmou pretender
impedir os atos de abuso e maus tratos contra os animais, descritos em estudos
juntados com a inicial. Pleiteou a concessão da tutela antecipada, e requereu a
procedência do pedido, para que fosse determinada a suspensão imediata das provas
com animais no II Festival de Laço e Tambor de Cotia e outros festivais ou
eventos similares que se pretenda realizar na cidade até o final do julgamento
da presente ação e para que fosse determinada a suspensão imediata de aulas e
treinamentos das modalidades de laçadas dos animais. Razão parcial lhe assiste,
como medida de prevenção e proteção ao bem estar dos animais, conforme os
pareceres do Ministério Público em 1º e 2º graus. Toda prova produzida quanto à
matéria tratada nestes autos é contundente.”
Por meio de
ações civis públicas como essa, várias cidades também tiveram proibidos os
eventos de rodeio. Citamos, no Estado de São Paulo: Ribeirão Preto, Ribeirão
Bonito, Itu, São Pedro, Bauru, Arealva, Avaí, Itupeva, Cabreuva, Américo Brasiliense,
Rincão, Santa Lúcia, Boa Esperança do Sul e Cravinhos.
Na esfera
judicial, devem os atores sociais, legitimados para tanto, ajuizarem uma ação
direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal – o STF – contra
essa lei dos rodeios, pedindo, complementarmente, que a prática do rodeio e da
vaquejada seja proibida totalmente em nosso território nacional por afrontar o
artigo 225, § 1º, VII da CF/88.
Não custa
recordar que, no Brasil, há pouco tempo atrás, era permitida a matança de
índios e a escravidão de negros e que essa prática corriqueira da escravidão,
em particular, era economicamente muito lucrativa para alguns grupos sociais.
Em função de muitas lutas e pressões sociais, foram criadas leis que –
contrariando o interesse desses grupos que lucravam com a escravidão - não mais
a permitiam e que, atualmente, a tipificam como crime.
Entendemos
que os rodeios e vaquejadas se enquadram nessa mesma categoria de atraso ético,
espiritual e sócio-cultural a ser superado pela inelutável marcha civilizatória
rumo à evolução. Se você concorda com esse pensamento, una-se a nós nessa luta
contra os rodeios e vaquejadas, realizando as ações estratégicas acima
sugeridas. O que transforma o mundo são as atitudes! Seja a voz dos que não tem
voz! A Natureza e nós, defensores, contamos com você! O fim dos rodeios e das
vaquejadas no Brasil depende de nós. O que você se dispõe a fazer? Como diria o
cantor Vandré: “Vem, vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe faz a
hora, não espera acontecer!”
Por: Rodrigo Vidal
Advogado, psicólogo, servidor público federal e presidente
do grupo Crueldade Nunca Mais Pernambuco.
Ativista em defesa dos animais há mais de 10 anos.
MOVIMENTO MINEIRO PELOS DIREITOS ANIMAIS
"Liberdade aos Animais, ainda que tardia!"
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